Cornos das novelas dividem opinião do público
25 de fevereiro de 2007 • 11h18
Christiane Torloni interpreta Maria Alonso em Amazônia
Foto: João Miguel Jr./TV Globo/Divulgação
Foi-se o tempo em que o público via com pena ou antipatia os personagens traídos em novelas. Atualmente, a famosa "pulada de cerca" já não é mais um grande castigo ou motivo de sofrimento para os "cornos" da teledramaturgia.
O comportamento mais liberal da sociedade influenciou a ficção e já pode ser visto nos textos das tramas. Mesmo as produções de época mostram maior permissividade com relação às traições. É o caso de Amazônia - De Galvez a Chico Mendes, cuja primeira fase é ambientada em fins do século 19.
Na trama, Osmar Prado vive o italiano Gianni, diretor de uma companhia de dança e casado com a bailarina espanhola Maria Alonso, papel de Christiane Torloni. A personagem, no entanto, apaixona-se loucamente por Galvez, vivido por José Wilker, com quem foge para o Acre. Mesmo enganado, Gianni aceita a mulher de volta anos depois. "Para ele, a ignorância é a verdadeira fonte da felicidade", explica Osmar.
No vocabulário popular, Gianni seria considerado um "corno manso", por aceitar passivamente a traição sofrida. É o tipo de personagem que normalmente desperta a pena dos espectadores. Outro que não sabe das escapadinhas da namorada é Tadeu, vivido por Rodrigo Lombardi em Pé na Jaca. O ator conta que já foi chamado de "corno" na rua várias vezes, mas que não se importa. "Muita gente comenta o comportamento da Leila comigo na rua. Cada um encara a traição de uma forma, a trama dá apenas os fatos. Acho que se o personagem descobrir tudo, ele entrará em depressão", avalia.
Na próxima novela das oito, Paraíso Tropical, o autor Gilberto Braga também discutirá a tolerância à traição no triângulo formado por Renée de Vielmond, Tony Ramos e Maria Fernanda Cândido. Na história, o empresário Antenor, de Tony, é casado há 30 anos com Ana Luísa, papel de Renée. Mas há 15 mantém um caso com a advogada Fabiana, vivida por Maria Fernanda.
"O Antenor é o personagem mais machista que já escrevi. Ele não está nem aí de trair a mulher", revela Gilberto. Para Tony Ramos, que possui um sólido casamento de mais de 30 anos, encarar com naturalidade uma traição nem passa pela sua cabeça. "Acho um horror, mesmo em novelas. Ninguém merece ser corno. Acredito na franqueza entre os pares", diz.
Para o autor Marcílio Moraes, a forma como o público encara o comportamento dos traídos nas novelas depende da trama. Ele acredita que os telespectadores são mais críticos quando o dono dos "chifres" é o vilão da história. "Gosto de fazer meus vilões se tornarem cornos. É uma maneira interessante de dar ao espectador um sentimento de vingança do vilão", explica Marcílio, autor de Vidas Opostas. Na trama, o grande "corno" é o delegado Nogueira, vivido por Marcelo Serrado. "É um corno com todos os chifres a que tem direito", brinca o autor.
A escritora Ana Maria Moretzsohn destaca as diferenças de receptividade do público quando o corno é homem e quando é mulher. Para ela, a sociedade ainda é muito machista e vê com desconfiança a traição feminina nas novelas. "Acho que quando é o homem a trair, ele sempre é o machão, o que pode tudo, enquanto a mulher é coitadinha. Já quando a mulher trai, é julgada de vagabunda e outras coisas", acredita. Para tentar diminuir o preconceito, em sua próxima novela, Luz do Sol, da Record, a autora criou um "corno" e uma "corna". "Será tudo na maior tranqüilidade e com muita discrição", garante.
Chifres doloridos
Nem mocinho, nem bandido. Na tevê, muitas vezes um ator fica marcado por ter interpretado um personagem "corno". Uma cena de traição bem feita é marcante para o telespectador. Entre os detentores dos "chifres" mais famosos da tevê, está Sinhozinho Malta, papel de Lima Duarte em Roque Santeiro. Na novela, o personagem tinha que dividir o amor de Viúva Porcina, de Regina Duarte, com Roque, interpretado por José Wilker.
Mais recente na história da teledramaturgia, outra grande punhalada amorosa foi levada ao ar em Belíssima. Júlia, de Glória Pires, foi duplamente traída ao descobrir que sua filha Érica, de Letícia Birkheüer, tinha um romance com André, vivido por Marcelo Antony. Ao descobrir o caso, a empresário agride os dois fisicamente e os enxota de sua mansão. "O barato do folhetim é que ele destaca essas situações que podem ser vividas por qualquer um", conclui Glória.
Dona Flor e seus Dois Maridos, romance de Jorge Amado, tem um dos triângulos amorosos mais famosos da ficção brasileiro. Adaptado para o cinema em 1975, chegou à tevê em 1998, com a protagonista vivida por Giulia Gam. Numa cena famosa da minissérie, ela segue de braços dados com seus dois maridos. De lado, está o "corno" Teodoro, vivido por Marco Nanini. E, do outro, o finado Vadinho, de Edson Celulari.
Instantâneas
# Malvino Salvador já encarnou dois "cornos". O primeiro foi Tobias de Cabocla e o segundo ainda está no ar em O Profeta, onde o ator interpreta Camilo.
# Enquanto alguns atores ganham fama como maridos traídos, José Mayer é considerado o grande garanhão da teledramaturgia. Ele protagonizou sedutores memoráveis em Presença de Anita e Mulheres Apaixonadas.
# Os "cornos brabos" também são comuns nas novelas. Em Vale Tudo, Leila mata Odete Roitman por engano, pensando se tratar de Maria de Fátima. A personagem achava que estava sendo traída pelo marido, Marco Aurélio. Os personagens foram vividos respectivamente por Cássia Kiss, Beatriz Segall, Glória Pires e Reginaldo Faria.
# O tema traição deu o pontapé inicial na trama de O Dono do Mundo. Na história, Felipe Barreto, vivido por Antônio Fagundes aposta que conseguirá levar Márcia, personagem de Malu Mader, para a cama antes de seu marido, Walter, papel de Tadeu Aguiar. E consegue.
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